Luto antecipado: é possível preparar-me para a morte de alguém?

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Quando alguém que amamos é diagnosticado um uma doença terminal ou incurável, que inevitavelmente leva à morte, muitas vezes ocorre o luto antecipado. E é normal.

A psicóloga Cristiana do Nascimento explica que, geralmente, este processo envolve “muito sofrimento, o projectar da morte, antecipar as circunstâncias em que vai acontecer, imaginar a vida depois da perda”. Antecipar o luto pode ser positivo, mas cada caso é um caso. “O luto é universal, todos vamos passar por um processo de luto. Mas é muito individual, muito íntimo.”

O que é expectável sentir num processo de luto antecipado?

Desde logo é importante perceber que o luto antecipado pode ser saudável, mas nem sempre. “Depende da forma como este luto é vivido”, diz Cristiana. Se por um lado este processo pode ajudar a pessoa a “ter alguns mecanismos” no momento da perda, também é verdade que “pode gerar muita ansiedade”, e por vezes lutos antecipatórios levam, depois da perda, a processos de luto prolongado.

“Se for um luto em que a pessoa consegue, de alguma forma, estar preparada para o acontecimento da morte, aí sim é positivo.” A psicóloga relata que “quando temos alguém que amamos numa fase terminal é quase inevitável pensar como é que vão ser os momentos finais”. No entanto, se isso provocar um sofrimento tal que “comprometa o bem-estar da pessoa” ou se provocar “a incapacidade” de viver o dia-a-dia “deixa de ser positivo”.

O luto antecipado “gera uma grande ansiedade e medo da perda, gera muitas vezes sentimentos de impotência também”. Cristiana do Nascimento garante que é normal haver “oscilações emocionais” e que estas são “muito importantes”. Bem como a tristeza, sofrimento por antecipar a ausência da pessoa. A antecipação é normal, e saudável, desde que não se torne incapacitante.

Um luto antecipado pode atenuar a dor no momento da perda? É possível prepara-me para a morte?

Depende. A dor da perda pode, nos casos em que é “expectável”, ser atenuada pelo “tempo de preparação”. A psicóloga explica que “termos tempo de aproveitar a pessoa, fazer algumas actividades, de dizermos o que precisávamos dizer à pessoa” pode ajudar a não ficarmos com um sentimento de “devia ter feito, devia ter dito”, o que pode atenuar alguns sentimentos de culpa após a perda.

Mas acontece haver pessoas que fazem o luto antecipado e esperam ter “um luto mais positivo” após a perda e isso não acontece. Porque quando a pessoa morre, explica a psicóloga, “percebemos que a finitude é real, que não vamos voltar a ver aquela pessoa” e isso pode sempre despoletar um grande sofrimento, levar a lutos prolongados. É, por isso, difícil afirmar que é possível preparar-se para a morte.

Como lidar com o luto antecipado?

Falar sobre a morte é uma forma de lidar com este processo. Cristiana diz que o luto antecipado pode ser benéfico para, por exemplo, preparar certos “rituais”, como o funeral. “A morte é ainda um tema tabu na nossa sociedade, evita-se socialmente falar sobre isso”, conta a psicóloga. Por isso, “é muito raro haver as pessoas manifestarem as suas vontades”, a explicarem o que querem que aconteça depois da sua morte. Mas “é importante pensar e falar sobre isso, até para que sejam respeitadas os desejos da pessoa”.

Além disso, é “muito importante não haver culpabilização.” Não é saudável entrar num ciclo de culpabilização e sobretudo não interiorizar que “podiam ter feito mais, com certeza a pessoa fez tudo o que estava ao seu alcance”. A psicóloga fala ainda da aceitação. “Trabalhar a aceitação da finitude da vida, aceitar que todos nós vamos morrer um dia. E que esse acontecimento é inevitável.”

“É importante termos também uma rede de apoio, familiar ou social”. É crucial haver, ao longo de todo o processo (antes e depois da perda) uma rede de apoio “com quem consigamos conversar, expressar as nossas emoções, ter um local de acolhimento para o nosso sofrimento.” E permitir-se também sentir “bons sentimentos.” “As pessoas não se podem sentir culpadas por sentir emoções positivas num processo de luto, elas também fazem parte da vida.”

Depois, é preciso estar atento aos sinais. Se “transitamos para uma fase em que o luto impacta negativamente a nossa vida” podemos precisar de recorrer à ajuda de um profissional, recorda a psicóloga.

Como posso navegar estes sentimentos e, ao mesmo tempo, aproveitar o tempo com a pessoa?

A chave é aceitar. Quando há uma aceitação e tranquilidade em relação à perda iminente da pessoa, o luto antecipado “ajudar a viver mais tempo de qualidade com aquela pessoa, poder fazer despedidas, poder ter conversas difíceis, ter disponibilidade de ouvir o que a pessoa ainda tem para dizer”, lembra Cristiana. No fundo, essa capacidade de “proporcionar diversas coisas e atender a desejos da pessoa” são o que nos pode dar alento nestes momentos. É uma forma saudável de viver este processo e, diz a psicóloga, “uma das melhores formas de lidar com a perda.”

Neste 1 de Novembro a Ordem dos Psicólogos Portugueses divulgou um documento com estratégias para lidar com o luto. Algumas das estratégias passam por manter uma rotina, evitar o isolamento social e ter autocuidado. Além disso, a pessoa enlutada pode procurar prestar homenagens à pessoa que morreu, escrever um diário de luto ou visitar lugares simbólicos.

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