
Os primeiros dias da 30.ª Conferência do Clima da ONU, a COP30, em Belém do Pará, no Brasil, estão a ser marcados por um ambiente que já foi descrito como reflectindo “o caos glorioso da humanidade”: chuvas torrenciais (mas breves) e trovoada, calor intenso e ar condicionado insuficiente, sanitas entupidas e falta de água, protestos vibrantes e até um pequeno motim, descreveu o autor da popular newsletter de nicho Climate Diplomacy Brief.
A COP de Belém, que tem o segundo maior número de participantes registados, surge depois de três anos de cimeiras do clima organizadas em países com limites à liberdade de protesto (Egipto, Emirados Árabes Unidos e Azerbaijão) – e isso vê-se nas reivindicações sonantes que se ouvem e vêem desde os primeiros dias, dentro e fora do recinto.
Na noite de terça-feira, segundo dia da cimeira, a entrada da Zona Azul – onde decorrem as negociações, com acesso restrito – foi invadida por manifestantes que entoavam palavras de ordem como “eles não podem decidir por nós sem nós”. Numa crítica à limitada participação de povos indígenas nas negociações oficiais, este pequeno motim desafiou o tom mais optimista que a organização tem apresentado nesta COP30.
Já na quarta-feira, uma “Barqueata” marcou o arranque simbólico da Cúpula dos Povos, evento paralelo à COP30. Movimentos indígenas e ONG protestaram pela justiça climática e pela inclusão dos povos originários e comunidades tradicionais nas discussões oficiais, levando faixas contra o avanço da destruição dos seus territórios. Esta marcha fluvial, que o Azul acompanhou, reuniu cerca de 200 embarcações nas águas do Rio Guamá, na Baía do Guajará, gravando uma imagem marcante da primeira COP na Amazónia.
Em conferência de imprensa na noite anterior, no recinto da Aldeia COP – o acampamento indígena montado perto dos pavilhões de negociações, num desafio aos preços excessivos da hospedagem em Belém – o cacique Raoni Metuktire, conhecido líder indígena brasileiro, criticou abertamente os projectos de infra-estruturas financiados pelo Governo brasileiro, como a potencial exploração de combustíveis fósseis junto à foz do rio Amazonas e a construção da ferrovia Ferrogrão.
O chefe Raoni acusou também o agronegócio de causar a desflorestação da Amazónia, alertando: “Os ventos estão mais fortes, os rios estão secando. Se o desmatamento continuar, muitas coisas ruins acontecerão para todos nós.”
ANDRE COELHO/EPA
Riscos da inacção
Enquanto a mobilização popular aumenta a pressão por resultados concretos, as negociações dentro de portas (entretanto consertadas) da Zona Azul continuam a ser um processo complexo, a começar pela definição da agenda oficial completa, que não foi possível concluir na segunda-feira. O presidente da COP30, André Corrêa do Lago, reforçou que as negociações, ainda no seu início, estão numa “boa direcção”, com “fortes indicações de que toda a gente aqui quer mostrar ao mundo que o multilateralismo funciona”.
Já o director de estratégia e alinhamento da COP30, Túlio Andrade, lembrou que as negociações multilaterais precisam sempre de mais conversas e mais tempo. Contudo, a equipa negocial do Brasil tem notado disponibilidade dos países: “o que estamos a ver agora é um diálogo saudável que não víamos há muito tempo”, num sinal de “mudança nas dinâmicas”, por comparação a cimeiras recentes.
Numa conferência de imprensa nesta quarta-feira, Jake Werksman, experiente negociador da Comissão Europeia, afirmou que a UE está disponível para debater todos os itens da agenda. Entre elas encontra-se a proposta do pequenos Estados insulares sobre uma avaliação das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC, na sigla em inglês) para 2035, depois de um relatório técnico ter identificado que as metas apresentadas pelos países não serão, nem de perto nem de longe, suficientes para reduzir as emissões ao nível necessário.
Andre Borges/EPA
Vários grupos de negociação, como os Países em Desenvolvimento com Visões Comuns (Like-Minded Developing Countries) e o Grupo Árabe, estão reticentes a qualquer mudança nos pressupostos do Acordo de Paris, que define, nomeadamente, que as metas climáticas sejam voluntárias, de acordo com o que cada país considera ser a maior ambição possível.
Financiamento e transição justa
Para a UE, o objectivo é dar ao mundo a confiança de que o combate às alterações climáticas está a avançar, melhorando o nível colectivo de ambição. Maria Samuelsen, da presidência dinamarquesa, sublinhou a necessidade de desenvolver a decisão sobre financiamento do ano passado, onde os países acordaram aumentar o financiamento climático público para os países em desenvolvimento até 2035 para 300 mil milhões de dólares.
Está prevista uma sessão no sábado para debater o roteiro para fazer com que esse valor se multiplique para 1,3 biliões de dólares, através da cooperação com os bancos multilaterais e o sector privado.
No que toca ao programa de trabalho para a transição justa e a criação de um eventual Mecanismo Global de Transição Justa, as diferenças Norte-Sul estão a tornar-se mais claras, com a recusa de países como o Reino Unido a recusar reconhecer a necessidade de um mecanismo específico, global e inclusivo, e a tentar limitar o âmbito das negociações.
O Presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva tinha deixado um apelo para que se chegasse a um roteiro sobre a transição para longe dos combustíveis fósseis (“transition away from fossil fuels”), a decisão que marcou a COP28, no Dubai. André Corrêa do Lago, contudo, não quis fazer promessas, explicando que a abertura do chefe de Estado baseava-se nas garantias que o próprio Brasil deu na sua NDC. O país está disposto a “acolher e participar” em discussões sobre o tema, esclareceu, ciente de que a elaboração de um eventual cronograma não é um item da agenda oficial nem algo que tenha sido formalmente levantado durante a COP.
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