
Depois de A Dança das Andorinhas, publicado na segunda temporada da colecção Novela Gráfica, e do livro infantil Ovelha, a autora libanesa Zeina Abirached regressa às livrarias portuguesas com uma adaptação em dois volumes de O Profeta, de Khalil Gibran, numa edição conjunta do PÚBLICO com a Levoir, que antecipa a presença da autora na edição de 2025 do Amadora BD, Festival que contará com uma exposição que lhe é dedicada.
Lançada originalmente em 2023, por ocasião do centésimo aniversário da publicação original de O Profeta, a versão de Zeina Abirached é a primeira transposição para a banda desenhada de uma obra de culto, extraordinariamente popular a nível mundial, que, além de ter inspirado várias canções, já tinha sido adaptada aos mais variados formatos, desde musicais até um filme de animação. Este projecto inovador nasceu não de uma ideia de Zeina, mas de um convite das Éditions Seghers à autora, que, curiosamente, nunca tinha lido o livro na íntegra. Como a própria refere no prefácio do primeiro volume: “O Profeta não me era desconhecido: esse pequeno livro, presente na biblioteca da família em Beirute, acompanhou-me nas minhas peregrinações. De mudança em mudança, a fina edição de bolso teve sempre lugar nas minhas prateleiras. No entanto, raramente folheado, não me era familiar. Reconhecia algumas frases, citadas aquando dos casamentos ou de cerimónias e, devo confessá-lo, essa proximidade quase obrigatória, tendo em conta as minhas origens, era frequentemente acompanhada de um sentimento de incómodo. Era suposto conhecer O Profeta, e no entanto… algo me mantinha à distância.
Foi a ler O Profeta, lápis na mão e caderno de desenho em cima dos joelhos, que finalmente o encontrei.”
Tal como Gibran, um libanês imigrado nos Estados Unidos, onde escreveu O Profeta directamente em inglês, em 1923, também Zeina Abirached, nascida em 1981 em Beirute, viu-se obrigada a imigrar para França em 2004, vivendo hoje em Omã, por força do seu casamento com um diplomata francês, e a partir de onde tem transposto as suas memórias do Líbano em novelas gráficas como A Dança das Andorinhas, título seleccionado por Alexandra Lucas Coelho para a sua Volta ao Mundo em Cem Livros, ou o magnífico Le Piano Oriental (ainda inédito em português). Daí a facilidade com que Zeina, uma exilada, se identificou com Al-Mustafá, o jovem profeta que na cidade de Orphalese espera há doze anos pelo navio que o levará de volta à sua ilha natal.
Na realidade, o termo “adaptação” talvez não seja o mais adequado para classificar a versão de Zeina Abirached da obra-prima de Khalil Gibran, pois o texto original não foi tocado, mantendo-se presente na íntegra nesta versão desenhada, onde o texto e a imagem dialogam e dançam nas nuvens, numa atmosfera mágica entre a fábula e o conto de fadas, em páginas tão belas como simples e elegantes, que se aproximam mais do poema ilustrado do que da banda desenhada tradicional.
É bem evidente a preocupação da autora em se afastar da estrutura narrativa tradicional da banda desenhada. Em vez de dividir as páginas em tiras e em vinhetas, como é habitual, Abirached optou antes pelas páginas duplas ocupadas por uma única imagem, imagem essa que pode ser apenas uma dança de balões de texto. Uma escolha que aconteceu de forma instintiva, pois, como a própria refere numa entrevista, “avancei de olhos fechados, deixando-me guiar pela música das palavras de Gibran”. E a força das palavras é evidente num livro em que não há propriamente uma intriga e o texto tem uma força primordial.
Muito se poderia ainda dizer sobre este encontro feliz entre Zeina Abirached e Khalil Gibran, mas isso ficará para o texto da próxima semana, dedicado ao volume 2. Até lá, deixo-vos com a frase lapidar do escritor libanês Amin Maalouf: “O traço inimitável de Zeina Abirached oferece um cenário de sonho à sabedoria poética de Gibran.”
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